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Isenção do imposto de importação é ineficaz para reduzir preços dos alimentos

A isenção do imposto de importação sobre alimentos não deve reduzir o preço dos produtos para o consumidor final como espera o governo, avaliam analistas do mercado e representantes do setor produtivo. A medida foi anunciada na quinta-feira (6) pelo vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) juntamente com outras ações, como um estímulo à produção de itens da cesta básica no Plano Safra e o fortalecimento de estoques reguladores.

Ao todo, nove produtos terão zerada a alíquota de importação: carne, café, milho, açúcar, massas, biscoitos, sardinha, óleo de girassol e azeite de oliva. Já a cota de importação isenta de óleo de palma, atualmente em 65 mil toneladas, subirá para 150 mil toneladas.
As mudanças entram em vigor nos próximos dias, após aprovação pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

No Congresso Nacional, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) classificou as medidas apresentadas pelo governo federal como “ineficazes para efeito imediato”, em especial a isenção de impostos para produtos importados, que reduziriam a arrecadação “sem garantir o reforço ao apoio da produção brasileira”.

“O principal entrave para a redução dos preços dos alimentos não está na tarifa de importação, mas na própria cadeia produtiva nacional”, diz o líder da oposição na Câmara, deputado Luciano Zucco (PL-RS).

Para ele, a iniciativa do governo deve beneficiar grandes importadores e distribuidores, mas não necessariamente o consumidor final. “A redução da tarifa não garante que os preços nas prateleiras dos supermercados cairão na mesma proporção, já que outros custos, como transporte, armazenagem e margem de lucro dos intermediários, continuarão pressionando os valores.”

O próprio governo não tem uma estimativa de impacto da medida nos preços. “É difícil você, matematicamente para cada item, explicitar”, disse Alckmin no anúncio da iniciativa.

Produtos que terão isenção têm excedente de produção no Brasil

Contraditoriamente, foram selecionados para o estímulo à importação alguns dos principais produtos da pauta de exportações brasileira.
O Brasil é o maior fornecedor global de carne bovina, por exemplo. Em 2024, vendeu para outros países cerca de 2,5 milhões de toneladas do produto fresco ou congelado, enquanto comprou apenas 40,6 mil toneladas.

Além disso, 95,1% do valor total importado de proteína bovina veio do Paraguai, Uruguai e Argentina, países que já não pagam imposto de importação, por pertencerem ao Mercosul.

As importações de café em 2024, por sua vez, somaram US$ 83,4 milhões, enquanto o país exportou o equivalente a US$ 11,4 bilhões do grão.
No caso do milho, foram US$ 8,2 bilhões em exportações no ano passado, e US$ 292,5 milhões em importações, das quais US$ 270,4 milhões vieram do Paraguai (92,4%) e US$ 10,3 milhões da Argentina (3,5%), que já são isentos da tarifa de importação.

Para Paulo Bortolini, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), a zeragem do imposto de importação sobre o cereal é “inócua”. “Não tem efeito prático algum no sentido de aumentar a oferta”, diz.

“O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de milho e o segundo maior exportador. Nós temos preços baixos, senão mais de 100 países ao redor do mundo não comprariam nosso milho”, afirma.

“Quando se fala em zerar impostos, a primeira pergunta é: vamos importar de onde?”, questiona. Ele ressalta que o Brasil tem excedente de produção da commodity. Ainda que fosse possível trazer mais milho do exterior, os custos envolvendo operações portuárias e a logística interna para levar o produto para consumo e industrialização no interior do país impediriam a queda nos preços.

“O governo parece estar perdido, atribuindo a causa dos preços dos alimentos aos produtores, quando na verdade a causa da inflação é a expansão monetária em função de gastos públicos exorbitantes”, diz.

Procuradas pela reportagem, entidades representativas de outros setores impactados diretamente, como as associações brasileiras de Proteína Animal (ABPA) e da Indústria de Café (Abic), preferiram não se manifestar sobre o assunto por enquanto.

Economistas veem impacto insignificante da isenção do imposto de importação na inflação

“Os produtos que o Brasil exporta majoritariamente, como é o caso de café e carnes, os impactos tendem a ser muito reduzidos na inflação”, diz Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital.

“Primeiro porque os produtos importados compõem uma fração muito pequena do que é disponibilizado internamente, e, segundo, porque são produtos que são consumidos e adquiridos pelo topo da pirâmide social, e não pela base, em que a inflação de alimentos de fato corrói muito.”

Já os produtos que o Brasil mais importa, como é o caso da sardinha, do azeite de oliva e do óleo de girassol, têm pouco peso nos indicadores de variação de preços, como o IPCA.

Ela destaca ainda que historicamente, a partir de abril, os preços dos alimentos têm uma tendência sazonal de queda. “Esses efeitos se sobressaem à redução das alíquotas [do imposto de importação] e não podem ser confundidos ou atribuídos à redução do imposto desses alimentos”, afirma.

A economista Andréa Angelo, estrategista de inflação da Warren Investimentos, lembra que itens como carne e azeite, que mais poderiam impactar na inflação, têm problemas de oferta em escala global.

“Supondo que importássemos muito desses produtos, o câmbio depreciaria e comeria parte do ganho”, diz. “Além disso, há um impulso à demanda – num ambiente de demanda já forte, provavelmente parte do ganho fica com o dono do mercado.”

Para a economista, no entanto, pode haver um efeito positivo no longo prazo, com o aumento da competição no mercado brasileiro. Uma medida mais efetiva para ela seria a isenção do ICMS sobre a cesta básica por parte dos estados, conforme proposto pelo governo federal.

Fonte e Foto: Gazeta do Povo

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